A Nova Era da Humanidade

Por Paulo Henrique de Figueiredo[email protected]

Embalada pelo sucesso do filme “Bezerra de Menezes – O Diário de um Espírito”, que levou mais de 500 mil brasileiros ao cinema, a revista Galileu, da Editora Globo, publicou uma matéria de capa sobre o Espiritismo, dando a ela o título “A nova era do Espiritismo: Novas influências estão reinventando a Doutrina no Brasil”. Para escrever seu texto, o jornalista Pablo Nogueira visitou alguns grupos espiritualistas onde observou a mistura do hinduísmo, yoga, terapias como reikie cromoterapia, além de auto-ajuda em seus rituais e práticas.A Galileu se propôs responder à seguinte questão: “O espiritismo irá incorporar essas influências ou os tradicionalistas acabarão mantendo as coisas separadas?”.

A divulgação do Espiritismo tem atraído o interesse de milhões de pessoas, intuitivamente em busca de sua consoladora mensagem. Mas para compreender a Doutrina Espírita é preciso estudar com profundidade e cuidado seus conceitos, e isso leva tempo e pede dedicação. Não é possível, por exemplo, aprender física lendo algumas revistas ou assistindo documentários. A divulgação científica serve para atrair o interesse, mas para se compreender uma ciência, é preciso estudar, mergulhando em livros fundamentados ou estudando em cursos especializados.

Não há jornalista da imprensa leiga, portanto, que compreenderão Espiritismo nas poucas semanas que tem para escrever sua matéria. Por outro lado, muita gente dedica-se a divulgar o Espiritismo sem conhecê-lo. Existe uma diferença fundamental entre Espiritualismo e Espiritismo. Grupos esotéricos e suas tradições mágicas existem desde muitos séculos antes de Allan Kardec. No século 19, pesquisadores como Eliphas Levi divulgavam o esoterismo. Francês, Alphonse Louis Constant nasceu em 1810, filho de um sapateiro. Iniciou seus estudos como sacerdote, mas sua verdadeira vocação foi a magia. Em 1855, lançou a Revista Filosófica e Religiosa e nesse mesmo ano publicou seu mais famoso livro, Dogma e Ritual da Alta Magia. Enquanto isso, na Inglaterra, madame Blavatsky estudava os fenômenos mediúnicos, explicados pelas tradições orientais, como budismo, hinduísmo e magia. Décadas depois, Gérard Anaclet Vincent Encausse, conhecido como Papus, dedicou sua vida à divulgação das ciências ocultas. Foram grandes divulgadores e até hoje fazem muito sucesso. Essas iniciativas combatem o materialismo, afastando a perniciosa descrença. Mas nada disso tem a ver com Espiritismo.

Coisas novas, novos nomes

Allan Kardec criou novos nomes para diferenciar a Doutrina Espírita do misticismo e magia, já bastante divulgados: “Para as coisas novas necessitamos de palavras novas, pois assim o exige a clareza de linguagem, para evitarmos a confusão inerente aos múltiplos sentidos dos próprios vocábulos. A palavra espiritualismo tem uma significação bem definida, éo oposto do materialismo, quem quer que acredite haver em simesmo alguma coisa além da matéria é espiritualista. Diremos, portanto, que a Doutrina Espírita ou o Espiritismo tem porprincípio as relações do mundo material com os Espíritos. Osadeptos do Espiritismo serão os espíritas. O Livro dos Espíritos contém a Doutrina Espírita.

Quando o jornalista da revista Galileu saiu em busca de organizações e grupos para encontrar quem representava o Espiritismo, cometeu um grave erro. Não há quem represente o Espiritismo. Ele não é uma religião formal. Não tem sacerdotes nem liturgia, muito menos rituais. Nem mesmo depende de médiuns, que são apenas instrumentos para a comunicação com os Espíritos. São úteis à pesquisa espírita quando desprendidos de idolatria ou interesses financeiros. As manifestações mediúnicas são um instrumento da pesquisa espírita enão a finalidade da Doutrina. Não é preciso ser espírita paraser médium. E não é preciso ser médium para ser espírita. O Espiritismo é uma convicção pessoal, baseada na liberdadede consciência, na negação do materialismo, como explicouKardec, em O Livro dos Espíritos: “Seria fazer uma idéia bemfalsa do Espiritismo acreditar que a sua força decorre da práticadas manifestações materiais. Sua força está na sua filosofia,no apelo que faz à razão e ao bom senso. Na Antiguidade eleera objeto de estudos misteriosos. Hoje, não tem segredospara ninguém: fala uma linguagem clara, sem ambigüidades;nada há nele de místico, nada de alegorias suscetíveis de falsasinterpretações. Ele quer ser compreendido por todos porquechegaram os tempos de se fazer que os homens conheçam averdade. Não reclama uma crença cega, mas quer que se saibapor que se crê, e como se apóia na razão será sempre mais fortedo que as doutrinas que se apóiam sobre o nada”.

Não existem representantes oficiais do Espiritismo. É espíritatodo aquele que simpatiza com seus princípios, transformandosua conduta a partir desse estímulo. A prática espíritaestá fundamentada na igualdade entre os homens diante deDeus, a tolerância, a liberdade de consciência e a benevolênciamútua. “O Espiritismo não reconhece por seus adeptos senãoaqueles que colocam em prática os seus ensinos, quer dizer,que trabalham pela sua própria melhoria moral, porque é osinal característico do verdadeiro espírita”, afirmou Kardec,na Revista Espírita.

Em nome do Espiritismo

Se os jornalistas da Galileu estiverem lendo estas palavras,devem estar confusos. Eles também foram conversar comrepresentantes do movimento espírita, ouviram a FederaçãoEspírita Brasileira, membros do Conselho da União das SociedadesEspíritas do Estado de São Paulo. Citaram o exemplo deindivíduos que abandonaram essas instituições, como MarildaMachini, que após sair da Federação Espírita de São Paulo porseu interesse pelo reiki, declarou: “Sabia que havia pessoasinteressadas pelo tema lá dentro, mas não podíamos conversara respeito. Achei que era uma atitude dogmática e resolvi sair”.A matéria da Galileu vê nesses casos o suficiente para declarara existência de tradicionalistas lutando contra místicos liberaispara definir o futuro do Espiritismo. Esse é o coração do artigo.E, novamente, não passa de um grande equívoco.

Existem milhões de espíritas e nenhum deles pode falarem nome do Espiritismo. Deixamos à Kardec a lúcida explicação,na Revista Espírita de 1869: “O Espiritismo não é nemuma associação, nem uma congregação. Seus adeptos não sãoinscritos em nenhum registro oficial. É muito bem reconhecidoque se lhe poderia avaliar a quantidade pelo número e aimportância das sociedades, freqüentadas somente por umaínfima minoria. O Espiritismo é uma opinião que não exigenenhuma profissão de fé, e pode espalhar no todo ou emparte os princípios da Doutrina. Basta simpatizar com a idéiapara ser espírita. Ora, esta qualidade não sendo conferida pornenhum ato material, e não implicando senão obrigaçõesmorais, não existe nenhuma base fixa para determinar onúmero dos adeptos com precisão”.

Movimento espírita e Espiritismo

Há uma bem definida diferença entre “movimento espírita”e “Espiritismo”. O primeiro é uma iniciativa de pessoas interessadasem estudar e compreender a Doutrina Espírita, peloestudo dos livros publicados por Allan Kardec, mantendo ocontato com os Espíritos por meio da mediunidade. Já o Espiritismoé uma iniciativa dos Espíritos, surgida quando a Terraestava preparada para a evolução moral: sua regeneração. Omaterialismo, divulgado por alguns cientistas, jamais foi provado.Não há uma só evidência de que o nada exista após amorte. Não passa de uma crença na descrença. O Espiritismoé uma iniciativa dos homens sábios que, depois da morte, seuniram no mundo espiritual para acordar a Humanidade paraa realidade das leis universais.

A ciência espírita oferece ao mundo uma novidadequando não confia a ninguém o direito de falar em seunome, pois como toca em todos os ramos do conhecimentohumano, nenhum homem ou Espírito sabe o suficiente paratanto. A novidade está em que o Espiritismo é obra coletiva:“Dispondo todo Espírito, como todo homem, apenas delimitada soma de conhecimentos, não estavam eles aptos,individualmente, a tratar com profundidade as inúmerasquestões que o Espiritismo envolve. Essa ainda é uma razãoporque não podia a Doutrina ser obra nem de um só Espírito,nem de um só médium. Tinha que emergir da coletividadedos trabalhos, comprovados uns pelos outros”, explicam osEspíritos em A Gênese.

Além disso, não cabe aos espíritas confiar em tudo que osEspíritos dizem, nem em todo médium: “Não confiando a umúnico Espírito o encargo de promulgar a Doutrina, o mais pequenino,como o maior, tanto entre os Espíritos, quanto entreos homens, traz sua pedra para o edifício, a fim de estabelecerentre eles um laço de solidariedade cooperativa, que faltou atodas as doutrinas decorrentes de um tronco único”.

Cuidado com falsos profetas

É preciso estar alerta aos falsos profetas. Por isso, qualquerfato novo precisa harmonizar-se com os conceitos das obraspublicadas por Kardec: “Pela universalidade do ensino, nenhumade suas partes tendo valor, nem autoridade, a não serpela sua conexão com o conjunto, devendo todos harmonizarse,colocado cada um no devido lugar e vindo cada um nahora oportuna”.

Neste período de transição, não se espera de todos a compreensãoda natureza do Espiritismo. Não basta participar domovimento espírita para compreender a Doutrina Espírita.E nem mesmo é preciso fazer parte dele para ser espírita.Muitos que se dizem espíritas, inclusive, foram responsáveispor atrapalhar seu caminho, como afirmou Allan Kardec, jáEspírito, numa comunicação mediúnica publicada na RevistaEspírita: “Se é justo censurar os que hão tentado explorar oEspiritismo ou desnaturá-lo em seus escritos, sem o terempreviamente estudado, quão mais culpados não são os que,depois de lhe haverem assimilado todos os princípios, nãocontentes de se lhe apartarem do seio, contra ele voltaramtodos os seus esforços! É, sobretudo, para os desertores dessacategoria que devemos implorar a misericórdia divina, pois queapagaram voluntariamente o facho que os iluminava e com oqual podiam esclarecer os outros. Eles, por isso, logo perdema proteção dos bons Espíritos e, conforme a triste experiênciaque temos feito, bem depressa chegam, de queda em queda,às mais críticas situações!”.

A Ciência, despida do equivocado materialismo, se unirá aoEspiritismo, fará compreender então as leis naturais em todasua grandeza, como explicou Allan Kardec, em A Gênese: “OEspiritismo e a Ciência se completam reciprocamente. A Ciência,sem o Espiritismo, se acha na impossibilidade de explicarcertos fenômenos só pelas leis da matéria; ao Espiritismo, sema Ciência, faltariam apoio e comprovação. O estudo das leisda matéria tinha que preceder o da espiritualidade, porque amatéria é que primeiro fere os sentidos. Se o Espiritismo tivessevindo antes das descobertas científicas, teria abortado, comotudo quanto surge antes do tempo”.

O Fim do materialismo

A maior tarefa do Espiritismo está em acabar com o materialismo,maior chaga. Para isso, concorrem todas as iniciativasfilosóficas e religiosas do mundo. Aos poucos, as diferenças eequívocos cairão por si mesmos. Em tempos de turbulência etransição, o melhor remédio é a tolerância.

O maior problema do mundo moderno não está na fúria danatureza, mas no orgulho e egoísmo do homem, raiz de todosos males. A resposta está na solidariedade e na fraternidade.No futuro, ninguém mais será espírita, pois os fundamentos doEspiritismo −como reencarnação e vida após a morte− serão reconhecidoscomo lei natural de uma nova era da Humanidade.Até lá todos serão esclarecidos, e as divergências de hoje serãolembradas como próprias de uma infância cultural: Passadoconfuso de um mundo, finalmente, feliz.

PAULO HENRIQUE DE FIGUEIREDO é publisher da revista UniversoEspírita. Estudioso do Espiritismo há mais de 20 anos, além deescrever textos para veículos de comunicação espírita, é autor do livroMesmer, a Ciência Negada e os Textos Escondidos. www.universoespirita.com.br

 

Este conteúdo não reflete, necessariamente, a opinião da Casa Espírita Nova Era.


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