A Pesquisa e os Pesquisadores têm o seu dia!

Por Marcelo Henrique Pereira, Assistente da Vice Presidência de Cultura e Ciência da Federação Espírita Catarinense

“O movimento é a grande lei do Universo, na ordem moral como na ordem física, e o objetivo do movimento é o progresso para o melhor; é um trabalho ativo, incessante e universal; é o que chamamos o progresso.”
Canu, Espírito. Carta sobre a incredulidade. Revista Espírita, janeiro e fevereiro de 1861. Allan Kardec.

No calendário da humanidade há uma infinidade de datas. Algumas, internacionalmente cultuadas e vivenciadas, outras nacionalmente, por força das convenções e das homenagens locais. Assim é que 8 de julho é o Dia Nacional do Pesquisador, instituído por lei federal (n. 11.807/2008) em alusão à data em que foi criada a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), instituição que se autodenomina como “entidade civil, sem fins lucrativos nem cor político-partidária, voltada para a defesa do avanço científico e tecnológico, e do desenvolvimento educacional e cultural do Brasil”. Oportuna, assim, a referência.

Vale salientar que, na exposição de motivos do projeto de lei apresentado pelo então senador Eduardo Azevedo, consta a seguinte justificativa: “No momento atual, que muitos denominam de ‘era do conhecimento’, e em que cada vez é mais importante o papel da pesquisa, do desenvolvimento e da inovação tecnológica, é importante criar uma data nacional para homenagear pesquisadores e para que sirva também de um dia de reflexão sobre as contribuições e as necessidades da pesquisa brasileira”. A instituição de um dia para homenagear os pesquisadores, então, serve para reconhecer e enaltecer o trabalho por eles realizado e refletir sobre as contribuições e as necessidades da pesquisa.

E o que é, então, pesquisa? Quem são os pesquisadores que, desde 2009, têm podido comemorar o “seu” dia?

Pesquisa é, conceitualmente, a ação ou conjunto de ações que têm por objetivo a descoberta de novos conhecimentos em dada área do pensamento (e das ciências). Seu maior “laboratório” são as universidades e faculdades, já que os pesquisadores têm como objetivo produzir conhecimento para dada disciplina acadêmica, sempre com o intuito de disseminar esse conhecimento e contribuir para o avanço da humanidade. A pesquisa tem, destarte, caráter científico e possui objeto, metodologia e método próprios para cada uma das ciências em que se processar a investigação. Os procedimentos científicos, derivados do processo metódico de investigação, irão buscar, assim, encontrar uma (ou mais) resposta(s) para dado problema. Importante, ainda, que a pesquisa seja ÉTICA, isto é, desenvolvida com o respeito às leis humanas e às naturais (da Natureza), voltadas ao bem comum, de manifesto interesse para dado grupo de pessoas (ou para toda a humanidade), já que irá resultar em um trabalho capaz de produzir novos e relevantes resultados para a Sociedade.

É em face das pesquisas – científicas – que a vida humana, individual e coletivamente – progride e se torna “mais fácil”, de vez que os experimentos resultam na simplificação de situações existenciais e na melhora da qualidade de vida em diversos cenários. Como imaginar o nosso mundo atual, materialmente falando, sem a infinidade de invenções que, produzidas em série, industrialmente, chegam às residências e locais de trabalho e estudo de todo o país (ou do mundo)? Como conceber a realização de diversas atividades, otimizando o tempo e aprimorando-se os resultados, sem utilizar os bens e os procedimentos que foram desenvolvidos nas academias e instituições educacionais de todos os tempos?

Todo pesquisador sabe que há sempre um ponto de partida. O conhecimento não “brota” do acaso ou do “além”. Mesmo nos casos mais rudimentares de experimentos científicos (veja-se, por oportuno, o célebre fato da queda da maçã sobre a cabeça de Isaac Newton que o levou a conceituar, experimentalmente, a Lei da Gravidade), os acontecimentos “casuais” da vida carecem de ser observados (e repetidos) para a formulação das teorias e a demonstração objetiva das leis regentes dos fenômenos físicos (ou materiais). E em muitos casos, também, a pesquisa atual deriva de uma pesquisa anterior, seja para aprimorá-la seja para refutá-la, em função do próprio desenvolvimento da inteligência e das capacidades humanas de compreensão do que se passa à sua volta. O conhecimento científico derivado de uma pesquisa, assim, não tem qualquer pretensão de ser A VERDADE, posto que é mutável e sofre a ação do tempo e os efeitos do próprio desenvolvimento humano e social. Verdade, assim, do ponto de vista da CIÊNCIA, é algo que serve durante algum tempo, até que seja demonstrado que se tratava de um erro, derivado do domínio (precário) do conhecimento em época anterior e da incapacidade, àquele tempo, de se produzirem pesquisas científicas com maior precisão.

O grande salto qualitativo de quem produz pesquisa é ter a mente aberta para o NOVO, permitindo o acesso (ainda que temporário) ao domínio sobre dado conhecimento.

O pesquisador é, portanto, alguém que não se CONFORMA com o posto, tido como “pronto e acabado”. Ousa investigar, pensar, repensar, testar, refletir novamente, para compor formulações que justificam suas hipóteses, demonstrando a validade (ainda que momentânea) de sua (ou suas) tese(s).

É um artista, porque compõe a partir de suas observações, sinfonias novas para a explicação dos fatos da vida.

É um ser inquieto, sempre em busca de novas explicações e resultados.

É um ser amoroso, porque primeiro ama a sua pesquisa, o objeto de investigação e deseja que ele possa servir aos outros – amor ao próximo, à humanidade.

É um indivíduo dedicado, que consome horas e mais horas a serviço do objetivo de materializar suas teorias, confirmando suas previsões ou desejos.

É um obstinado, que (quase) não descansa, pois a todo momento está pensando sobre suas pesquisas e, vez por outra, tem seus insights, como se dissesse a si mesmo: – Por que não pensei nisso, antes?

Esse alguém, o pesquisador, alimenta-se das próprias pesquisas, como o principal combustível de sua existência, aquilo que dá vida e cor ao seu viver. E como é gratificante experimentar a descoberta. Diz-se que Thomas Alva Edison, o fantástico inventor de mais de 1.000 facilidades da vida moderna, para conceber a lâmpada elétrica alcançou a marca de mais de 3.000 testes distintos, até “achar” a “fórmula ideal”. Repetições, repetições… Testes e mais testes… Experimentos de cada uma das teorias possíveis e imagináveis. Ao que, certa feita, ele mesmo declarou: “Gênio é dois por cento de inspiração e noventa e oito por cento de transpiração”. Muito esforço e dedicação, portanto.

Dito isto, como conceituar, então, a Pesquisa Espírita (e a Ciência Espírita, por extensão)? Existe pesquisa espírita pós-Kardec?

As pesquisas pioneiras decorreram da observação dos fatos (e dos fenômenos) espirituais (ou mediúnicos). Das mesas girantes e dançantes à cesta escrevente, passando pela tiptologia das batidas, e chegando à psicografia, o homem Rivail tudo observou com acuidade e interesse. Realizou, assim, a legítima ciência e pesquisa de observação, cunhando um método próprio e particular – até então inexistente – de aferição objetiva das “revelações” espirituais, dentro de um espírito de sistema, próprio à uma “nova modalidade” de ciência, a Ciência Espírita. Sua pesquisa não se restringiu ao momento de recebimento e reunião das mensagens pioneiras, para compor a obra primeira, “O livro dos espíritos” (e as que dela foram derivadas e complementares, tidas como básicas), porquanto continuou em permanente observação de novos fenômenos, em contato com novos fatos, estabelecendo um permanente processo de investigação e produção científica, no seu laboratório de pesquisas que ficou conhecido como “Revue Spirite” (Revista Espírita). É bem verdade que, literalmente, a Revue corresponde, hoje, às revistas em que os trabalhos de pesquisa são, após reconhecidos pela comunidade científica, publicados, dando estatura às próprias pesquisas e alçando-as à condição de universalidade (ainda que, repetimos, momentânea, até que novas pesquisas demonstrem estar, a anterior, em erro).

Mesmo considerando que o movimento espírita em geral muitíssimo e destacadamente se AFASTOU de Kardec (e do caráter de ciência e da forma de estruturação da pesquisa por ele sugerida e exemplificada), alguns pesquisadores pós-kardequianos se destacaram em várias áreas do conhecimento. À guisa de enumeração (sem ser exaustiva) podemos citar Aksakof, Barret, Bozzano, Crookes, Delanne, De Rochas, Dessoir, Du Prel, Fechner, Flammarion, Geley, Lodge, Lombroso, Maxwell, Myers, Ochorowicz e Zöllner, aos quais se juntariam os mais contemporâneos, brasileiros, José Herculano Pires, Deolindo Amorim, Eurípedes Barsanulfo, Silvino Canuto Abreu, Hernani Guimarães Andrade, Hermínio Corrêa de Miranda e Henrique Rodrigues, todos já desencarnados.

Na atualidade, em nosso país, há um destacado contingente de pesquisadores espíritas. Gente que desbrava este universo espiritual na busca da adequada compreensão dos fatos segundo as Leis Espirituais, na interpretação espírita. Podemos citar, exemplificativamente, os seguintes grupos, em ordem apenas alfabética: Associação de Estudos e Pesquisas Espíritas de João Pessoa (ASSEPE), Centro de Cultura, Documentação e Pesquisa do Espiritismo Eduardo Carvalho Monteiro (CCDPE-ECM), Centro de Estudos e Pesquisas Espíritas Allan Kardec (CEPEAK), Centro de Estudos e Pesquisas Espíritas de Curitiba (CEPEC), Centro de Pesquisa e Documentação Espírita (CPDoc), Grupo de Estudos e Pesquisas Espíritas Herculano Pires (GEPEHP), Instituto de Pesquisa e Ensino da Cultura Espírita (IPECE), Liga de Historiadores e Pesquisadores Espíritas (LIHPE), Sociedade de Estudos e Pesquisas Espíritas (SEPE), e, é claro, o caçula, Núcleo de Estudos e Orientação para a Pesquisa (NEOPE) que temos a honra de integrar, junto à Federação Espírita Catarinense, que está promovendo, como já divulgado, o primeiro Curso de Formação de Pesquisadores Espíritas, junto à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

É bem verdade que existem pesquisadores “isolados”, que realizam trabalhos individualmente e cuja difusão dos resultados de pesquisa não é abrangente, na maioria dos casos. Alguns deles se inscrevem em eventos específicos, de difusão, como o ENLIHPE (Encontro da Liga de Historiadores e Pesquisadores Espíritas, mencionada acima) e no Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita (SBPE), realizados respectivamente em São Paulo e Santos (SP), nacionalmente, e nos Congressos e Conferências Regionais Espíritas Pan-Americanos, promovidos pela Confederação Espírita Pan-Americana (CEPA). E, ainda, os eventos patrocinados pelas Associações Brasileiras de Médicos Espíritas (AME-Brasil), de Magistrados Espíritas (ABRAME), de Juristas Espíritas (AJE) e de Divulgadores do Espiritismo (ABRADE) e suas filiadas regionais ou estaduais, ou na sede do Instituto de Cultura Espírita do Brasil (ICEB). De maneira geral, há reduzido espaço em eventos tradicionais, promovidos por associações, centros, sociedades ou federações, para a apresentação e discussão de teses ou pesquisas, lamentavelmente.

Espera-se que a nova fase da Cultura e da Ciência Espíritas, capitaneada pelas instituições acima mencionadas e por outras que possam desenvolver atividades e contemplar espaços para a Pesquisa Espírita sejam o alvissareiro contexto deste atual momento que o Espiritismo experimenta no contexto social, para materializar a previsão do próprio codificador, quanto à passagem da fase religiosa para a intermediária (que é essencialmente dialógica), conduzindo à de regeneração social.

Vale, ainda, relembrar Herculano Pires (em “Curso Dinâmico de Espiritismo”) na sua definição da proposta espírita, que se materializa na cultura e na ciência, por meio da pesquisa séria e competentemente conduzida: “Tudo no Universo se processa mediante a ação e o controle de leis naturais, que correspondem à imanência de Deus no Mundo através de suas leis. Toda a realidade verificável é natural, de maneira que os espíritos e suas manifestações não são sobrenaturais, mas fatos naturais explicáveis, resultantes de leis que a pesquisa científica esclarece. O Sobrenatural só se refere a Deus, cuja natureza não é acessível ao homem neste estágio de sua evolução, mas o será possivelmente, quando o homem atingir os graus superiores de sua evolução. Todas as possibilidades estão abertas e franqueadas ao homem em todo o Universo, desde que ele avance no desenvolvimento de suas potencialidades espirituais, segundo as leis da transcendência.”

Com mais espaços e muito mais pesquisas, os Pesquisadores Espíritas terão motivos de sobra para comemorar o Dia Nacional do Pesquisador (8 de julho). Vale dizer, também, que esta data, já escolhida para comemorar a atividade de pesquisa em geral, pode ser também a da Pesquisa Espírita, porque neste dia, em 1927, foi escrita a primeira psicografia de Francisco Cândido Xavier e, neste ano, 2013, nesta data regressou ao Plano Maior um dos maiores pesquisadores espíritas da contemporaneidade, Hermínio Corrêa de Miranda. Oportunos motivos, assim, para que os espíritas também considerem tal data como o Dia do Pesquisador Espírita.

E viva a pesquisa e os pesquisadores espíritas!

Este conteúdo não reflete, necessariamente, a opinião da Casa Espírita Nova Era.


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+ Marcelo Henrique