Bento XVI e o absolutismo católico

Laerte Braga

A afirmação do papa Bento XVI proclamando a Igreja Católica Apostólica Romana como a única igreja cristã com legitimidade para tanto tem várias implicações. A primeira delas o absolutismo católico retomado na presunção do papa que fora da igreja romana não existe salvação.

Ao resgatarmos uma declaração anterior de Bento XVI sobre ser menor, mas ser fiel aos seus princípios, é fácil entender que o papa segue nessa mesma linha ao falar o que falou nesta semana.

Há outra implicação. O espantoso crescimento das chamadas igrejas neo pentecostais, a de Edir Macedo está em 100 países, ganha novo alento à medida que o papa retorna a situações anteriores ao Concílio Vaticano II. É o caso da missa celebrada em latim. O espaço ocupado pela igreja de Macedo em países africanos é assustador e conta com apoio de verbas de agências do Texas.

Bento XVI quer um rebanho pacífico, submisso, governado segundo a vontade do sumo pontífice que, por sua vez, se impõe a todo o espectro não laico da igreja romana.

É um caminho perigoso para a igreja, fecha portas, encurta espaços e permite que sejam vistas como reais as projeções que falam em uma população evangélica maior que a católica, no caso do Brasil (maior país católico do mundo), num espaço de 30 anos.

Sem falar nas implicações políticas. O papa cai na armadilha da nova ordem econômica ao entender que os donos do mundo optarão pela igreja romana todas as vezes que se fizer necessária a \”intervenção divina\”, como no caso do Iraque, para libertar e \”catequizar\” os povos \”bárbaros\” do século XXI.

Ledo engano. Bush e companhia, seja republicano ou democrata, já entenderam que Edir Macedo faz qualquer negócio, é capaz de expandir-se para todos os lados e tem conceitos e princípios flexíveis, muito mais adequados aos \”negócios\” que os dos homens do Vaticano.

Ele, o bispo Macedo e seus similares.

Um reencarnacionista diria que Bento XVI é o próprio Torquemada, ou algum escrivão dos processos inquisitórios devolvido à matéria para \”recuperar\” o poder, a glória e o fausto de uma igreja que não existe mais desde a percepção que a Terra é redonda e gira em torno do sol e não o contrário.

Os avanços do Concílio Vaticano II estão sendo jogados por terra e num dado momento da História o papa, com certeza, se verá isolado nos limites do pequeno Estado do Vaticano, vítima das próprias pernas e seus passos.

Fica esclarecido e se dá conhecimento a todos os cristãos que quem não for católico não é cristão, não está ao abrigo da \”única e legítima igreja cristã\” e, portanto, \”em pecado\”. Mais ou menos como um selo de qualidade nos tempos em que todos buscam um ISO qualquer. Como a História é implacável, Bento XVI não viu que no fim do certificado tem um monte de letrinhas miúdas e nelas a data de validade.

Um novo rebanho fundamentalista está sendo criado. Tal e qual no mundo dos negócios os seres viram mercadoria, nesse caso mercadoria religiosa, na presunção absolutista de um papa que em menos de um ano já causou mais estragos à igreja que qualquer outro conservador tenha causado, se levarmos em conta o momento, o tempo, o espaço.

Estragos maiores que os causados por Pio XII em seus acordos com os nazistas. João XXIII e Paulo VI haviam recobrado o sentido cristão da igreja. João Paulo II iniciou o caminho do retrocesso e agora Bento XVI retorna às piores catacumbas que se conhece.

As da escuridão e da fé cega, submissa e sem sentido que não o da obediência aos senhores absolutos da palavra divina. Bush deve ter emprestado o celular mágico, o que fala com Deus, para que o papa dissesse o que disse.

Esse tipo de situação me lembra aqueles filmes sobre Roma antiga, onde o imperador pede a um soldado que se apresente para o sacrifício da vida por ele César e muitos soldados se apresentavam hipnotizados pelo poder da ilusão e da fantasia que os césares eram deuses.


Laerte Braga é jornalista. Nascido em Juiz de Fora, trabalhou no Estado de Minas e no Diário Mercantil. Escreve no Fazendo Mídia

Este conteúdo não reflete, necessariamente, a opinião da Casa Espírita Nova Era.


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