Cineasta brasileiro espera que pandemia gere mais empatia por situação de refugiados

Karim Aïnouz lançou o filme “Aeroporto Central”, que trata do tema.

Em vez de medo e xenofobia, o isolamento e a incerteza em relação ao futuro provocada pela pandemia têm o potencial de gerar mais empatia em relação ao outro, especialmente em relação àqueles que já enfrentavam dificuldades antes mesmo de a COVID-19 emergir, como refugiados, migrantes e pessoas em situação de vulnerabilidade social.

Em vez de medo e xenofobia, o isolamento e a incerteza em relação ao futuro provocados pela pandemia têm o potencial de gerar mais empatia em relação ao outro, especialmente em relação àqueles que já enfrentavam dificuldades antes mesmo de a COVID-19 emergir, como refugiados, migrantes e pessoas em situação de vulnerabilidade social.

A expectativa é do cineasta brasileiro Karim Aïnouz, que lançou na sexta-feira (24), diretamente nas plataformas de streaming, seu filme “Aeroporto Central”, que trata da situação de solicitantes de refúgio abrigados no extinto Aeroporto de Tempelhof, em Berlim.

Construído nos anos 1920, o aeroporto de proporções gigantescas foi reformado na década de 1930 pelo regime nazista. Desativado em 2008, serviu de abrigo para solicitantes de refúgio entre 2015 e 2019, transformado também em parque público.

Ao retratar a vida de quem fugiu da guerra para sobreviver, Aïnouz mostra a “suspensão do tempo” encarada por refugiados que aguardam por meses – ou até anos – uma decisão do Estado alemão sobre sua permanência no país.

Ao longo de um ano, o documentário acompanhou a vida do jovem estudante sírio Ibrahim e do fisioterapeuta iraquiano Qutaiba. Em meio a entrevistas, aulas de alemão e exames médicos, eles tentam lidar com a saudade de casa e a ansiedade gerada pela possibilidade de deportação.

Para Aïnouz, é possível traçar alguns paralelos com a situação vivida por bilhões de pessoas confinadas atualmente em suas casas em meio à pandemia,  sob a perspectiva de dificuldades financeiras e do medo de infecção.

“Essa incapacidade de saber o que é o futuro, e (o fato) de que a decisão sobre o que vai ser o futuro não ser mais sua, mas colocada de forma incerta, é parecido com o que esses personagens estão passando naquele momento”, disse Aïnouz em entrevista ao Centro de Informação das Nações Unidas (UNIC Rio).

“Tem uma lição de humildade também (…). São pessoas que não têm nada, que perderam tudo o que tinham. Só têm o ‘daqui para frente’. Por isso, eu achei que seria interessante passar o filme especificamente neste momento, dentro de uma perspectiva do streaming”, afirmou.

O documentário foi lançado nas plataformas Now, Vivo Play, Oi Play, Itunes, Google+, Filme Filme e Looke. O longa estava previsto para estrear nos cinemas brasileiros dia 26 de março, mas devido à pandemia de COVID-19, a Mar Filmes e o Canal Brasil decidiram lançá-lo diretamente em vídeo sob demanda. 

Para o cineasta, o documentário e a crise atual podem fazer com que o espectador não apenas se coloque no lugar dos refugiados, mas também de todas as pessoas em situação de vulnerabilidade social, como os sem-teto e os mais pobres, que estão sob maior risco de se infectar pela COVID-19.

“No Brasil, temos refugiados brasileiros dentro do próprio Brasil, quando você vê bairros tão abastados e bairros tão pobres”, comparou o cineasta. “Eu espero que isso (a pandemia) nos aproxime da dor dessas pessoas. Espero que isso nos possibilite ser mais solidários e menos hostis.”

Esperança

Mesmo em uma situação de espera, em que não podem retornar para casa nem sabem ao certo qual será seu futuro, os refugiados retratados em “Aeroporto Central” mantêm a esperança de que suas vidas mudarão para melhor na comunidade de acolhida.

“Quando você vê um garoto de 17 anos que vai embora de seu país, não porque ele quer, mas porque é ejetado por conta de uma guerra, arrisca a própria vida para estar em um lugar que não é a casa dele, sozinho, sem poder voltar, e ainda assim tem esperança… é muito importante que a gente olhe para o outro dessa maneira”, disse Aïnouz.

“O filme traz uma lição importante para a gente que é: ‘vamos ter fé no futuro e vamos imaginar que o futuro certamente vai ser melhor do que o passado’ e vamos imaginar que as nossas diferenças nos unem, não nos separam. Nesse sentido, espero que o filme cause um grau de empatia que ele não teria causado se tivesse sido lançado em outro momento.”

A esperança também permeia a própria relação do cineasta brasileiro com o parque hoje existente no antigo Aeroporto de Tempelhof, que se tornou espaço público por conta de pressões da própria população.

“Sempre que eu estou lá, olho para aquelas pistas de pouso e penso: ‘nossa, eu estou aqui andando de bicicleta nesse sol lindo, com uma horta ali do lado, e aqui quem desceu foi Hitler de avião’. Então, tem uma sensação de esperança. E é um espaço público que continua mais vivo do que nunca.”

O cineasta brasileiro Karim Aïnouz estreou como diretor de longas-metragens com "Madame Satã". Outras obras incluem "Aeroporto Central", "Praia do Futuro" e "O Céu de Suely". Foto: Bob Wolfenson

O cineasta brasileiro Karim Aïnouz estreou como diretor de longas-metragens com “Madame Satã”. Outras obras incluem “Aeroporto Central”, “Praia do Futuro” e “O Céu de Suely”. Foto: Bob Wolfenson

Cinema em tempos de pandemia

Na opinião de Aïnouz – que já dirigiu mais de 15 filmes, entre eles “A Vida Invisível”, que estreou em Cannes na mostra Un Certain Regard em 2019 – o cinema como espaço físico será mais procurado após a pandemia, uma vez que as pessoas buscarão estar em contato social quando isso for seguro em termos de saúde pública.

“O cinema enquanto lugar vai ter uma explosão (no pós-COVID-19). A boate vai ter uma explosão. Os lugares de encontro vão ser lugares que, no momento em que a gente puder se encontrar de novo, vão ser lugares privilegiados”, previu.

Já como “uma máquina de contar histórias”, o cinema nunca foi tão importante, disse. “Imagine o que seria passar por essa pandemia sem poder assistir a uma série, a um filme. Sem poder ler um livro. Acho que a gente estaria todo mundo mais doido do que já está.”

“O cinema nunca se provou tão necessário. Ainda mais neste momento quando você pode apertar um botão e ver histórias do mundo inteiro. Ele veio para se provar como algo necessário, não como algo acessório ou de luxo”, assegurou.

Importância da cultura em meio à COVID-19

Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) alertou na semana passada em reunião com ministros de 130 países sobre a importância de se fortalecer o setor cultural, que enfrenta perturbações sem precedentes devido à pandemia da COVID-19.

Os ministros destacaram os benefícios sociais e econômicos do setor cultural em seus países, bem como concordaram com a necessidade urgente de investir no setor durante e após a crise.

As restrições de mobilidade e as medidas de contenção que os governos foram forçados a adotar devido à pandemia reduziram drasticamente o acesso à cultura no curto prazo e – se não forem tomadas medidas – podem enfraquecer todo o ecossistema cultural pelas próximas gerações.

Graças às plataformas online, no entanto, o acesso à cultura tem sido assegurado em muitas partes do mundo, inclusive por meio de museus, galerias e bibliotecas virtuais. Uma grande quantidade de músicos, dançarinos, artistas visuais e escritores tornaram seus trabalhos acessíveis online.

 

Para abordar o fato de o setor cultural ter sido um dos primeiros a ser afetado por esta crise e, ainda assim, o último a receber apoio orçamentário, muitos ministros destacaram os pacotes de financiamento de emergência que implementaram em seus países para salvaguardar, no curto prazo, os meios de subsistência de artistas, artesãos e profissionais criativos.

Apoio a refugiados e migrantes

A pandemia de coronavírus acelera, matando milhares de pessoas todos os dias. A população mais vulnerável a este surto inclui 70 milhões de crianças, mulheres e homens a deslocados à força por guerras e perseguições.

Para manter e mesmo expandir suas operações durante a pandemia do novo coronavírus, prevenir a disseminação da COVID-19 junto a refugiados e comunidades de acolhida e assegurar a continuidade de atividades vitais, a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) lançou globalmente um apelo de 255 milhões de dólares.

O ACNUR quer responder ao surto de coronavírus e continuar a agir em parceria com os governos nas respostas extra-emergenciais no contexto da pandemia.

O financiamento irá cobrir as necessidades orçamentárias adicionais do ACNUR para os próximos nove meses em resposta ao surto, e o plano de resposta será implementado pelas agências da ONU, com o apoio direto de ONGs internacionais, locais e outros parceiros.

O ACNUR agradece todos os seus doadores pelas importantes contribuições que nos permitem continuar trabalhando para oferecer dignidade, proteção e segurança para refugiados e solicitantes de refúgio no Brasil.

Este conteúdo não reflete, necessariamente, a opinião da Casa Espírita Nova Era.


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