O Inconsciente é o divino
Huberto Rohden, Trecho do livro Roteiro Cósmico: Martin Claret, 2011. pg. 129.
A superfície consciente da nossa natureza é o nosso pequeno ego humano – as profundezas inconscientes são o nosso grande Eu divino.
A Realidade Universal é o grande Inconsciente, não o Inconsciente da vacuidade, mas o Inconsciente da plenitude. O Inconsciente da plenitude é o Oniconsciente, mas esse Oniconsciente se apresenta ao nosso ego consciente como sendo o Inconsciente. Os extremos se tocam. Quem olha para dentro da treva nada enxerga; quem olha diretamente dentro da luz solar, nada enxerga. Aquela escuridão é a ausência da luz, esta é a plenipresença da luz. Treva total e luz total são, para nossa percepção finita, a mesma coisa – o Nada, o Vácuo, a Treva, a Ausência. Nós, os finitos, só enxergamos o Todo quando ele é reduzido a Algo, mas não o enxergamos como o Todo, que nos parece o Nada.
A luz Incolor da Realidade Total não é objeto de nossa percepção finita; só a Luz Colorida da Realidade Parcial, isto é, do Algo Finito, é que pode ser percebida por nós. Os nossos sentidos e o nosso Intelecto – o nosso ego humano – funcionam como “válvulas de redução”, diz Aldous Huxley; se assim não fosse, não poderíamos existir como indivíduos. O impacto da Realidade Total nos aniquilaria, desindividualizando-nos, universalizando-nos; deixaríamos de existir finitamente, continuando a ser universalmente. Mas esse “ser universal” não sou eu, não és tu, não é nenhuma creatura finita, isto é a Realidade Infinita do puro Ser. Nós, os finitos, existimos graças à nossa finitude; existimos a mercê das nossas limitações. Se não fôssemos limitados, não existiríamos como indivíduos.
Por isto, o Inconsciente do Todo, do Ser, do Infinito, é percebido por nós como um Inconsciente. O ontologicamente Inconsciente é, para nós, logicamente consciente, uma vez que “o conhecido está no cognoscente segundo o modo do cognoscente”.
Quando nos abismamos em profunda contemplação espiritual, estabelecemos ponto de contato entre o nosso finito consciente e o Infinito Inconsciente. E, quando o Inconsciente do Infinito sobrepuja o nosso consciente finito, então perdemos a percepção dos sentidos e a concepção do intelecto; tudo “desmaia” [1] diante do nosso consciente, nada mais sabemos de tempo e espaço, que são criações do ego consciente, e temos a impressão de submergirmos no eterno e no infinito, que são a negação de tempo e espaço.
Quando entramos profundamente no sagrado “Aum”, e quando espira a derradeira vibração sutil do “m” final, então, dizem os orientais, entramos no grande “nada” [2], que é a derrota do nosso consciente pelo Inconsciente. Estamos no terceiro céu, no samadhi, no ekstasis (êxtase), expressões várias para designar a absorção do consciente pelo Inconsciente.
Fonte:
Huberto Rohden, Roteiro Cósmico: Martin Claret, 2011. pg. 129.
[1] – A palavra “desmaiar” não vem do latim. Provavelmente, os portugueses a trouxeram do Oriente, em séculos pretéritos. Maya é a palavra sânscrita para “natureza”, quem desmaia, perde a noção de Maya; está fora de tempo e espaço, ambiente da natureza perceptivo-conceptiva.
[2] – Como a palavra “desmaiar”, também o vocábulo “nada” não é de origem latina. Na língua sânscrita, o termo “nada” quer dizer silêncio absoluto, o Infinito, o Vácuo. Quando o homem atinge o auge da sua contemplação mística, depois de esgotar todas as vibrações do sacro trigrama “AUM”, abisma-se no grandioso “Nada” do silêncio de Brahman. Esse Nada do existir é o Todo do Ser. O Nada da Imanência de Deus é o Todo da Transcendência da Divindade. Da Divindade nada pode o homem saber, de Deus ele sabe um pouco.
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