O silêncio NÃO é uma prece!

Marcelo Henrique

 

Olá, espírita frequentador de instituições espíritas. Como vai? Tudo bem? O que me conta de novo? Como está a ambiência da instituição que você frequenta? Muito silêncio por aí? Sim, porque o silêncio é uma prece, não é?

Não! Decisivamente, não!

E porque não, Marcelo, se eu já ouvi isso lá na casa espírita? Lembro-me, também, de tantas plaquinhas ou cartazes que eu já vi, aqui ou alhures? Ah, não vou esquecer também do sermão do dirigente, quando o povo fala muito, burburinhos aqui e ali, né? Ou quando o palestrante exalta a placa, dizendo que os “Espíritos” não gostam de barulho, de algazarra, e que o silêncio favorece as vibrações e os “trabalhos”…

Eis, aí, mais uma crendice instalada no centro, mais uma invencionice tupiniquim para a filosofia (?) espírita, ou para aqueles lugares que se autodenominam “espíritas”, neste país, de norte a sul, leste a oeste…

O que faz, você, quando fica em silêncio? Seja na casa espírita, seja em outro lugar, o que acontece, sinceramente, com a sua mente, com o seu pensar?

Há os que respondem: – fico concentrado; – faço orações, preces; – penso em coisas boas; – lembro as leituras ou as palestras; – desejo o bem; – penso no amor universal… E tantas outras respostas, digamos, “prontas”, para ilustrar o “modus procedendi” das instituições ditas espíritas, em nosso país.

Lá atrás, não sei quem, porque isso não está em Kardec. No máximo, os Espíritos teriam dito que “O silêncio é útil, pois no silêncio pões em prática o recolhimento, teu espírito se torna mais livre e podes entrar em comunicação com os Espíritos. Mas o voto de silêncio é uma tolice”, na resposta ao quesito 772, de “O livro dos espíritos”.

Notem bem: silêncio útil, para que o espírito se torne mais livre, propiciando, assim, o contato (comunicação) com os espíritos. Seja pela intuição, atributo que é de qualquer espírito (encarnado), seja pela mediunidade (atributo especial, prático, que nem todos têm). Mas não é uma prece, porque o indivíduo, ao silenciar exteriormente, não necessariamente entra em sintonia com os Espíritos (desencarnados) e nem “está em prece”. Sobre a prece e sua utilidade, enquanto diálogo mental, ver os esclarecimentos contidos tanto na obra primeira (itens 658 a 666), quanto em “O evangelho segundo o espiritismo” (capítulos XVII, 4 e XXVII, 10) e na Revista Espírita (janeiro de 1866 e dezembro de 1859), que são, por si só, satisfatórios e pertinentes para se diferenciar o que seja a “prece espírita” e a prece “religiosa”.

 

Então, consideremos que dada a versatilidade e a amplitude da frequência às instituições espíritas, tenhamos um sem-número de pessoas que: 1) nunca entrou, provocativamente, em contato com os Espíritos; 2) não saiba como fazer esse contato e a comunicação; 3) não saiba qual o significado e a abrangência das questões intuitivas; 4) não faça preces, habitualmente; 5) tenha vagas noções – e, quase todas elas, religiosas, como dogmas e ritos, advindos das religiões em geral – sobre o que é uma prece e qual o seu significado “espírita”; 5) aproveite os instantes de “silêncio geral” para pensar nas situações corriqueiras do dia-a-dia, nos problemas, nas dificuldades, nas contendas com o próximo, no que fez antes de chegar ou no que tem de fazer quando sair do centro espírita; etc.

E estará fazendo prece? Estará em sintonia plena, franca e produtiva com os BONS espíritos? Claro que não! Ilusão nossa será pensar que a “mera presença” no ambiente dito espírita irá propiciar que TODOS realizem a “santa” prática da prece ou, sem jocosidade, estejam todos sintonizados, vibrando no bem, contribuindo com as atividades espirituais e, mais do que isso, disseminando energias úteis…

A plaquinha, portanto, é, apenas e tão-somente um simulacro. Um gesto de “consciência tranquila” e, é claro, uma regra IMPOSTA a quem está no centro e quer CONTINUAR no centro… Senão, já vai “encostar” alguém da estrutura organizacional para te lembrar o que é PRECISO fazer e te admoestar dizendo que sua conduta NÃO ESTÁ SENDO COMPATÍVEL com o que se espera e o que se DETERMINA para aquele trabalho ou instituição.

E qual a causa essencial desse procedimento TUTELATÓRIO? Impedir, via de regra, a conversação, os debates, as discussões e a possibilidade da multiplicação do conhecimento, a partir de vertentes novas, opiniões e argumentações.

Via de regra os ambientes “ditos” espíritas não são espaços democráticos e favoráveis ao livre debate e o descortinar de ideias novas. As pessoas em geral que assumem ENCARGOS nos centros gostam de exercitar o domínio sobre os outros, valendo-se de regras aparentemente fraternas e de “origem” espiritual (sim, porque vai ter sempre aquele que vai buscar um excerto de uma obra, seja de Kardec, seja de qualquer outro “autor espírita”, destes mais “famosinhos”, para dizer que “fulano” ou “beltrano” está “recomendando” isto ou aquilo.

Não, meus amigos, o silêncio NÃO é uma prece. Nem nunca será. Nem poderá ser usado para favorecer a PRECE ESPÍRITA, aquela que brota da alma, direcionada ao(s) Espírito(s) que estão em concurso sensorial conosco. A prece, quase sempre, é uma fórmula ritualística nos centros espíritas, quase uma obrigação… Mesmo que se utilizem outras palavras, mesmo que não se recitem as conhecidas orações, tradicionais no meio espírita e em outras igrejas, mesmo que seja totalmente distinta e nova, ela estará impregnada da “formalística” que é originária das seitas e religiões.

O Espírita, não raro, não sabe que tem ferramentas poderosas em suas mãos. O Espírita em geral, gosta de repetir uma frase chiquista (“o telefone só toca de lá para cá”), com a simbologia de que são eles, os Espíritos Superiores, que nos “escolhem”. Isto por si só já é a anulação completa do pensamento e da filosofia trazida pelo pensador francês. O “espírito” da Doutrina Espírita está nas EVOCAÇÕES. Ora, quem evoca é o encarnado, é ele que “consulta”, “busca”, tenta “sintonizar” com os desencarnados. É ele quem emite a “onda espiritual” desejando contato, seja com os Bons (e esclarecidos) Espíritos em geral, seja com o espírito fulano ou beltrano, seja os nossos familiares e amigos que já se foram, sejam as mentes “iluminadas” da Humanidade, que nos deixaram, e que podem, pela mediunidade, pela sintonia vibratória, pelo exercício da metodologia kardeciana, voltarem para nos dar esclarecimentos e informações úteis.

Na instituição espírita que divido a direção com amigos encarnados, não temos a “plaquinha” nem qualquer outra exortação ao silêncio. Do contrário, as pessoas quando chegam à casa, se cumprimentam (até efusivamente, com abraços e beijos), trocam-se palavras sobre como está a vida e afins, até que chegue a hora da atividade dita prática, como uma palestra, uma reunião de estudo ou de laboratório mediúnico. As pessoas são convidadas a contribuir, seja oralmente, seja pelo pensamento, sem o ritual e a predição, obrigatória, feito lei, de ter que fazer silêncio e transformar esse silêncio em comunicação medianímica.

Com ou sem silêncio, somos ESPÍRITOS. E que o nosso proceder seja muito mais útil do que o mero silêncio, que oculta o que realmente somos e o que de fato estejamos fazendo naqueles minutos em que se-nos impõe.

 

Este conteúdo não reflete, necessariamente, a opinião da Casa Espírita Nova Era.


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