Recall dos Espíritas

Por Marcelo Henrique Pereira

Curioso, diria até intrigante este título, não? Recall dos Espíritas. Sim, você já deve ter visto esta expressão (recall) em anúncios na TV e nos jornais. Geralmente são emitidos pelos fabricantes de bens duráveis (aparelhos eletroeletrônicos e veículos), para solicitar aos consumidores que se dirijam a assistências técnicas ou concessionárias para a verificação deste ou daquele componente, evitando acidentes, danos e até mortes. É uma providência usual em muitos países, considerando a legislação vigente em cada um deles, no âmbito das medidas protetivas aos consumidores e relações de consumo. A intenção, em todos os casos, é evitar ações judiciais e polpudas indenizações por “falha do produto”, decorrente do próprio processo de fabricação ou de peças e componentes utilizados no fabrico. A expressão, originária do inglês, significa na tradução literal “chamar de volta” ou “chamamento” ou “recolhimento para avaliação”.

E o que é que isso tem a ver com os espíritas, Marcelo? O que você quer dizer com este termo?
Vamos lá…

Muitos de meus textos enquadram situações fáticas vivenciadas pelos espíritas, dentro do que se costuma chamar de “movimento espírita”. Nele, enquadro situações comportamentais, posturas e práticas de pessoas e instituições espiritistas, buscando associar as mesmas às orientações dadas por Kardec todas as vezes em que ele, após dialogar com os Espíritos e tomar ciência de informações por eles trazidas, disserta sobre a organização formal e atividades em geral, antevendo situações que poderiam ocorrer e estipulando como deveria ser o modo de agir de uns e outros. Em vários tópicos da Revista Espírita, por nós considerado o verdadeiro “laboratório experimental” do Codificador é possível tomar contato com oportunas instruções para o movimento espírita, tanto o da época de Kardec (meados do século XIX) como para os supervenientes.
Neste sentido, qualquer posicionamento crítico e sincero dos estudiosos e adeptos do Espiritismo, com foco nas organizações sociais (centros, associações e outras denominações, bem como ligas, uniões, federações e confederações), suas dinâmicas, estruturas, pronunciamentos, orientações e a práxis do dia a dia, permite perceber vários distanciamentos da conduta usual e a forma de tratamento em relação aos que pensam (ou agem) de modo diverso dos seus em relação às diretrizes apresentadas pelo Mestre lionês.

Ainda que estejamos cientes do longo processo de maturação da Doutrina Espírita como movimento social – tendo por base os chamados “períodos do espiritismo” que o próprio Codificador apresentou numa pontual dissertação contida na Revue Spirite de dezembro de 1863 – bem como das características conjunturais do Brasil e do povo brasileiro, considerada sua formação cultural e a influência de seitas ou religiões sobre a população (e sobre os espíritas), é preciso avançar e materializar os projetos espirituais alinhavados em conjunto por inúmeros espíritos, considerando, ainda, que independente do plano em que estejam, encarnados e desencarnados operam em parceria para a consecução daqueles objetivos inaugurais. É preciso avançar, portanto!

Em referência à Doutrina dos Espíritos não devemos perder de vista as suas características essenciais, cultural e espiritualmente assim enquadradas: PLURALISMO, HUMANISMO, LIVREPENSADOR, EDUCACIONAL, PROATIVIDADE, CONSTRUTIVISMO, PROGRESSIVIDADE, PERMANÊNCIA. Vamos enquadrar cada uma dessas características:

PLURALISMO – o Espiritismo permite a dialógica com toda e qualquer vertente do conhecimento humano. Ao interagir com outras filosofias e teorias, permite localizar as semelhanças e convergências. Na percepção de diferenças, não as repulsa, de imediato, mas procura verificar-lhes a lógica e o bom senso. Caso perceba, nelas, alguma utilidade, as reconhece como úteis para a Humanidade, não necessitando abarca-las em seu “corpo doutrinário”. Na convivência com outros modos de pensar, aproveita os instantes de contato e insiste no diálogo, como forma de aproximação entre seres, tendências e culturas. Tem como foco, sempre, o bem individual e coletivo.

HUMANISMO – é a filosofiamoral que atribui ao ser humano a condição principal, numa escala de importância. Assim sendo, a preocupação maior das prescrições espíritas deve ser a melhora da conduta humana, ética e moralmente falando, no plano encarnado, isto é, no mundo e nas relações humanas que se estabelecem. Em face da conjuntura de encarnados, o Espiritismo deve orientar os homens a serem melhores e a concentrar seus esforços no progresso do mundo em que vivem. Em outras palavras, a vida espiritual é ÚNICA, enquadrando as experiências na condição encarnada e desencarnada, significando que não podemos viver “no mundo” físico pensando estar “no mundo” espiritual. Devemos aproveitar cada uma das experiências.

LIVREPENSADOR – Kardec nunca pretendeu estabelecer autoridade hierárquica entre pessoas ou instituições. Mesmo quando prescreve a oportunidade da existência de um “Comitê Central do Espiritismo” (Revue, dezembro de 1868), Kardec não preceitua a obediência hierárquica e estabelece em vários outros trechos das obras que publicou a condição de absoluta liberdade de pensar em relação aos fundamentos e preceitos espiritistas e a aproximação em torno dos ideais e objetivos comuns. Parte do raciocínio individual de cada espírito que tem o seu modo particular de ver e entender as coisas. Na medida em que o ser vai avançando, melhor compreenderá as diversas situações de sua existência e, delas, tirará as melhores conclusões.

EDUCACIONAL – o Espiritismo é prospectivo, de modo que suas orientações e explicações, no contato e no diálogo com inteligências superiores desencarnadas, se dirigem ao melhoramento espiritual individual – com reflexos no coletivo – e a chamada “conduta espírita” decorre do processo de conhecimento e entendimento paulatino das Leis Espirituais e da perspectiva, sempre progressiva, de assimilação dos conceitos enquanto práticas. A pedagogia dos Espíritos, por assim dizer, tem raízes na maiêutica socrática, com Sócrates e seu discípulo Platão (considerados os precursores do Espiritismo), enquadra as pregações e os feitos de Jesus de Nazaré e perpassa os métodos educativos de Pestalozzi (o mestre de Rivail) e do próprio Kardec. O Espiritismo é educativo por excelência!

PROATIVIDADE – a Filosofia Espírita prescreve a necessidade da aplicação dos conceitos no contexto existencial de cada ser, de modo a caracterizar a influência do homem no progresso das ideias e das coletividades. As mudanças qualitativas no ambiente planetário não são obra dos espíritos desencarnados, mas da ação efetiva dos encarnados, tendo como referência a participação na Sociedade. Os espíritos disseram a Kardec que os bons precisariam deixar de ser tímidos e vencer a influência dos maus que são audaciosos; este é o caminho real para a consecução dos objetivos espiritistas de avanço da Humanidade e do Planeta.

CONSTRUTIVISMO – Construtivismo é uma das correntes teóricas que explicam o desenvolvimento da inteligência humana a partir de ações mútuas entre o indivíduo e o meio, considerando, ainda, que ele responde aos estímulos externos agindo sobre eles para construir e organizar o seu próprio conhecimento, de forma cada vez mais elaborada. Esta é a essência da existência espiritual, em que cada ser atua em relação ao meio e recebe, deste, influência direta, em reciprocidade. Portanto, a proposta espírita é a de construção e reconstrução permanente do mundo.

PROGRESSIVIDADE – considerado um dos princípios básicos do Espiritismo, a Lei do Progresso também se aplica à própria doutrina, de vez que tanto o homem encarnado evolui em termos de entendimento, lógica, raciocínio e percepção, quanto os espíritos superiores desencarnados podem tratar de temas de modo mais aprofundado, os quais não foram acessíveis ou compreensíveis ao tempo de Kardec. O próprio Codificador, ao estabelecer as bases do trabalho espiritista e ao definir o método de tratamento das mensagens e das manifestações mediúnicas, permitiu fosse possível aos seus continuadores contribuir com novas pesquisas e novos diálogos com os desencarnados, para desembocar na continuidade ou atualização do Espiritismo.

PERMANÊNCIA – Para não figurar apenas no “panteão da Humanidade” como mais uma filosofia, seita ou religião, muito bem intencionada, mas simplória ou fracassada nas suas propostas para as sociedades terrenas, o Espiritismo tem de acompanhar os progressos científicos, como asseverou Kardec. Acompanhar a ciência significa estar ciente dos experimentos e das teorias deles decorrentes em comparação com os postulados espíritas e permitir que novas comunicações espirituais permitam divisar temas e realidades que não eram preocupação dos homens ao tempo de Kardec. E, de outra sorte, contribuir para o progresso, participando de instituições que promovem a cultura e a ciência e debatendo, em diversos fóruns e ambientes sociais laicos, as questões de interesse do homem contemporâneo.

Com base em tais elementos, é de se perguntar: todos os espíritas e as instituições em geral estão atentas e são concordes com tais premissas? Mesmo considerando os distintos entendimentos pessoais e institucionais, propiciam a aproximação entre pessoas ou grupos, ou agem como “donos da verdade”, como “defensoras” de critérios parciais e subjetivos, distantes do caráter pluralista e integrativo da Doutrina Espírita? Reflitamos…

Durante muito tempo as instituições se muniram de “garantias” preestabelecidas para a manutenção de suas teses ou do status quo, em face da existência de muitas configurações adjetivadas como espíritas, mas diversas entre si em alguns pontos. Surgiu, por exemplo, a tese da “pureza doutrinária” que foi defendida a ferro e fogo para impedir as chamadas “enxertias” de práticas ou ideias no “corpo” doutrinário. À exceção de um episódio pontual, lá pela década de 60, em que Herculano Pires denunciou, com todo ardor e êxito, uma tentativa de adulteração dos livros básicos, por parte de uma editora que pretendia “incluir” interpretações que não estavam na versão original, tudo o mais tem me parecido extremamente despropositado. Há quem censure autores e obras, admitindo e prescrevendo a necessidade de um “índex” ou um catálogo para ser apresentado às instituições e livrarias ou bibliotecas espíritas, para selecionar o que “pode” ou não ser lido, vendido ou divulgado.
Este é um ledo equívoco, porquanto devemos deixar a cargo de cada espírita (ou simpatizante) o critério de seleção de suas leituras e, mais que isso, a lógica aplicada à leitura para selecionar o que seja ou não racional e consentâneo com os princípios ou axiomas espiritistas. Não queiramos, nós, espíritas da “fé raciocinada” e em pleno Século XXI, cometermos os mesmos erros do passado, patrocinados por religiões ou ideologias, em destruir livros, escondê-los de algum modo ou de desmerecer seus textos ou autorias. Cabe ao estudioso espírita o critério de seleção, sempre!

Fico triste e muito preocupado quando vejo valorosos, bem intencionados e dedicados companheiros daqui ou dali se levantarem contra determinados autores ou obras – quando não contra expositores e lideranças espiritistas – em função da discordância DE OPINIÃO. Alguns, até, mais vorazes, se dispõem a escrever e a publicar textos desqualificando pessoas ou conteúdos, como se fossem censores ou síndicos do Espiritismo. Agem, até, em contrário à prática da caridade e da compreensão interpessoal, como se tencionassem excluir dados companheiros de atividades ou desmerecer suas ideias e trabalhos. Já deveríamos ter sepultado há tempos esta tendência.

Particularmente, como iniciei na Doutrina e no Movimento Espírita na fase de pré-adolescência (aos 11 anos), procurei ler tudo o que me aparecia à frente. Li Roustaing, Ramatís, Pietro Ubaldi, Polidoro, Ranieri, Krishamurti, Jaci Régis, André Luís, Emmanuel, Joanna de Ângelis, Zíbia e seus romances, os clássicos, os cientistas, os filósofos, os religiosos… De tudo, procurei reter a melhor parte. Fazia anotações e comentários, recorria aos “livros básicos” (que, para mim, foram na ordem: “O que é o Espiritismo”, “O Livro dos Espíritos” e “O Livro dos Médiuns”, não me esquecendo de “O Principiante Espírita” e “Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas”, além da coleção completa da Revue, já citada neste ensaio). Utilizei, sempre, o Evangelho como ponto de consulta para palestras e estudos e nas meditações diárias ou semanais, nos vários momentos da existência e, por complemento, “A Gênese”, “O Céu e o Inferno” e “Obras Póstumas”, para trabalhos e pesquisas específicos. Não me considero melhor ou superior a ninguém, nem dotado de “amplo conhecimento” espiritista, mas a base das leituras e da frequência a grupos de estudo e de prática mediúnica, em distintas instituições, ainda na fase pré-adulta, me permitiu formar a estrutura de convencimento e de seleção de toda e qualquer leitura, espírita ou espiritualista.

Nunca deixei de ler qualquer obra ou citação, por mais desqualificadores que fossem os comentários de expositores, dirigentes ou articulistas sobre tal o qual obra. Pelo contrário, quanto mais criticavam, mais vontade e interesse me despertavam. E isso foi, é e será fundamental para quem pretende ser espírita e para quem deseja formar convencimento (nunca definitivo, diga-se de passagem) sobre temas de interesse espiritual. Essa abertura, creio, é essencial para aqueles que desejam conhecer e entender melhor cada um dos quadrantes dessa e da vida futura.

Assim, vislumbrando que o Movimento Espírita possa estar avançando, em face do que tenho visto em termos de organizações coletivas espíritas na atualidade, considerando as principais, com quem tenho tido contato, federações, confederações e entidades nacionais especializadas, percebo uma tendência muito positiva. E ela, para mim, irá ser portadora das seguintes mensagens-vivências:

1) Perspectiva da verdadeira UNIÃO ENTRE OS ESPÍRITAS, a partir dos pontos de conexão e similitude entre as distintas acepções de entendimento de pessoas ou grupos, investindo-se nas SEMELHANÇAS e discutindo, se e quando possível, com o caráter da amistosidade e do respeito, as diferenças porventura existentes;

2) Diálogo pessoal e institucional permanente seja pelas ligações entre si das pessoas e das instituições, seja pela abertura de espaços em eventos patrocinados por uns e outros para o debate salutar dos “pontos de vista” diversos existentes no movimento, favorecendo com o gesto do convite e da boa acolhida, quando da presença, de representantes daquilo que se cognomina de “correntes espíritas”;

3) Interlocução com distintas correntes filosóficas, ideológicas, religiosas ou não e movimentos sociais, para o trato de temas específicos, da atualidade planetária e de interesse de todos, assim como participação efetiva e qualificada em fóruns e eventos de debate de ideias, para divulgação do pensamento espírita e para o diálogo com outras formas de pensamento;

4) Investimento e interesse em atividades de caráter científico e cultural, para o desenvolvimento de ações de continuidade e atualização do Espiritismo, dentro da proposta de permanência espírita cunhada por Kardec, permitindo-se, quando e se necessário, a revisão de conteúdos das obras fundamentais, não para demonstrar que “Kardec estava em erro”, mas para averiguar se as informações disponibilizadas no final do século XIX ainda permanecem sob a mesma configuração; e,

5) Idealização de eventos que permitam a apresentação de novas teses e estudos ou pesquisas espíritas, de caráter científico ou cultural, os primeiros com a organização e acuidade devidas para a caracterização dos métodos e da excelência dos debates, os segundos para permitir a interlocução com a Sociedade, por meio da disseminação, o mais amplamente possível, das ideias espíritas, utilizando-se os mais variados meios: arte em suas várias expressões, letras, filosofia, mídia e meios de comunicação.

Este é o verdadeiro recall dos espíritas. Alguns defeitos – como os listados acima – precisam ser corrigidos. Trata-se de um chamamento para a mudança qualitativa, a permitir os avanços necessários. E para caminharmos a passos largos para a instauração do período de regeneração social, já que, na descrição posta por Kardec, temos de suplantar o período religioso posto que já estamos no intermediário, de transição entre este e aquele.

Vale salientar que a porção majoritária dos espíritas prescreve a existência de um caráter ou aspecto religioso do espiritismo, tratando-o como “uma religião” (ainda que em caráter ou sentido “filosófico”, como bem asseverou Kardec na Revue de dezembro de 1868), afirmando que, neste sentido, seria “a doutrina que funda os vínculos da fraternidade e da comunhão de pensamentos, não sobre uma simples convenção, mas sobre bases mais sólidas: as próprias leis da Natureza”. Será que todos sabem, realmente, o que é o tal “caráter ou sentido filosófico” do termo religião? Ou tendem a dogmatizar e a sacralizar a Doutrina Espírita e os escritos compilados por Kardec? Lembremos que isto é tão somente um ponto de vista, havendo outros, como o manifesto por aqueles que não encaram o Espiritismo como religião, dizendo-se espíritas laicos, os quais são afastados ou, até, boicotados como se não fossem espíritas!

Antes de concluir, gostaria de chamar a atenção para aquilo que Kardec, com a antevisão que lhe era característica, em face de sua bagagem espiritual e dos atributos que lhe fizeram ser nomeado o “organizador” do Espiritismo, disse a esse respeito em duas dissertações valiosíssimas, abaixo mencionadas.

A primeira, em “O que é o espiritismo” (1859) no célebre diálogo de Kardec com o padre, nestes termos: “O Espiritismo, melhor observado depois que se vulgarizou, veio lançar luz sobre uma multidão de questões até aqui insolúveis ou mal compreendidas. Seu verdadeiro caráter, pois, é o de uma ciência, e não de uma religião; e a prova disso é que conta entre seus adeptos homens de todas as crenças, que não renunciaram por isso às suas convicções: católicos fervorosos que não praticam menos todos os deveres de seu culto, quando não são repelidos pela Igreja, protestantes de todas as seitas, israelitas, muçulmanos, e até budistas e brâmanes. Ele repousa, pois, sobre princípios independentes de toda questão dogmática. Suas consequências morais estão no sentido do Cristianismo, porque o Cristianismo é, de todas as doutrinas, a mais esclarecida e a mais pura, e é por essa razão que, de todas as seitas religiosas do mundo, os cristãos estão mais aptos a compreendê-lo em sua verdadeira essência. Pode-se, por isso, fazer-lhe uma censura? Cada um, sem dúvida, pode fazer uma religião de suas opiniões, interpretar à vontade s religiões conhecidas, mas daí a constituição de uma nova Igreja, há distância.”

A segunda, na Revue de maio de 1859, na resposta ao abade Chesnel: “O Espiritismo, melhor observado depois que foi vulgarizado, vem lançar a luz sobre uma multidão de questões até aqui insolúveis ou mal resolvidas. Seu verdadeiro caráter é, pois, o de uma ciência e não de uma religião, e a prova disso é que conta, entre seus adeptos, com homens de todas as crenças, e que por isso não renunciaram às suas convicções: os católicos fervorosos que não praticam menos todos os deveres de seu culto, protestantes de todas as seitas, israelitas, muçulmanos e até budistas e brâmanes; há de tudo, exceto materialistas e ateus, porque essas ideias são incompatíveis com as observações espíritas. O Espiritismo repousa, pois, sobre princípios gerais independentes de todas as questões dogmáticas. Ele tem, é verdade, consequências morais como todas as ciências filosóficas; essas consequências estão no sentimento do Cristianismo, porque o Cristianismo, de todas as doutrinas, é a mais clara, a mais pura, e é por esta razão que, de todas as seitas religiosas do mundo, os cristãos são os mais aptos a compreendê-lo em sua verdadeira essência. O Espiritismo não é, pois, uma religião: de outro modo teria seu culto, seus templos, seus ministros. Cada um, sem dúvida, pode se fazer uma religião de suas opiniões, interpretar ao seu gosto as religiões conhecidas, mas daí à constituição de uma nova Igreja, há distância, e creio que seria imprudente dar-lhe a ideia. Em resumo, o Espiritismo se ocupa com a observação dos fatos, e não com as particularidades de tal ou tal crença, da procura das causas, de explicações que esses fatos podem dar de fenômenos conhecidos, na ordem moral como na ordem física, e não impõe mais um culto aos seus adeptos do que a astronomia impõe o culto dos astros, nem a pirotécnica o do fogo.

Kardec, assim, reafirma que o verdadeiro caráter espiritista é o de uma ciência (e não uma religião), permitindo coexistir entre seus partidários católicos, protestantes, budistas, bramanistas, etc., posto que cada ser continuaria a manter sua própria religião (ou a expressão íntima de sua religiosidade) e iria, pouco a pouco, compreendendo a natureza lógica e racional das Leis Espirituais, a que todos nós nos achamos sujeitos, compreendendo-lhes as causas e os efeitos.
E tudo isso, respeitosamente, dialogicamente.

A hora é, destarte, para a UNIÃO e o DIÁLOGO entre TODOS os espíritas, sem distinções ou exclusões. E diálogo só se faz com RESPEITO e ALTERIDADE.

É isto que precisa de Recall!

Mãos à obra, portanto! Kardec prossegue conosco!

 

Este conteúdo não reflete, necessariamente, a opinião da Casa Espírita Nova Era.


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+ Marcelo Henrique