É possível provar que alguém foi curado pelo tratamento de passes?

Basta ligar a televisão e passear pelos canais para encontrar filas enormes de testemunhas das curas feitas pelos sacerdotes nos templos. Repetindo uma prática que remonta o Antigo Egito, há milhares de anos. E, cheios de esperança, milhões de enfermos, desiludidos pelos recursos da medicina comum, buscam um milagre que os salve da dor, e muitas vezes do abandono.

Por outro lado, há o atendimento aos doentes nas casas espíritas, prometendo não um milagre, mas a cura pelo método criado por Franz Anton Mesmer, a ciência do Magnetismo Animal, associada às pesquisas da cura por Allan Kardec, unindo o passe magnético à eficácia da prece e do magnetismo espiritual, pela intervenção dos bons espíritos. O tratamento do magnetismo animal também foi adotado por Hahnemann, criador da Homeopatia. De tal forma que essas três ciências se aproximam, revolucionando a medicina no sentido de uma atuação não alopática, ou seja, a favor do esforço natural do organismo no combate da doença, considerando que semelhante atrai semelhante. Assim, uma ação dinâmica, seja do passe, seja do remédio homeopático, provoca, por semelhança, os sintomas relacionados ao ciclo da cura, acelerando-o, até que a saúde esteja recuperada.

Mas será possível provar que esses métodos funcionam?

Ou toda cura, fora dos recursos da medicina comum, seria um milagre?

Estariam corretos os sacerdotes ao exibir em seus templos fileiras de casos de sucesso, como provas da intervenção direta de Deus por meio de suas mãos?

Seria o sobrenatural a resposta para o anseio dos enfermos desenganados ou afastados pela falta de recursos dos caros tratamentos de ponta disponíveis pela medicina? Ou mesmo cansados das intermináveis filas pela espera do tratamento público?

O Espiritismo fundamenta sua causa exatamente na superação do sobrenatural pelo conhecimento racional, pelo caminho das ciências!

Há um grave engano nessa questão, e está em falar dele o objetivo deste artigo.

Escolher entre um grupo de atendidos os casos efetivos de cura, não prova que o método empregado no tratamento foi a causa do sucesso!

Desse modo, apresentar os doentes curados como prova da eficácia da intervenção, seja divina, seja um tratamento espiritual, seja mesmo um remédio, não tem fundamento científico. Pois outro fator envolvido no caso pode ter sido a causa fundamental. Ou seja, entre os doentes curados, é possível até mesmo que nenhum deles tenha se curado pelo tratamento proposto, mas por outros motivos, até mesmo uma recuperação espontânea e natural.

O médico Franz Anton Mesmer, criador do Magnetismo Animal

Junte um grupo de doentes, e, depois de um tempo determinado, alguns vão estar curados inevitavelmente, por uma simples questão estatística! Caso você tenha visitado esses pacientes todas as semanas, e durante a visita tivesse feito um gesto qualquer, repetindo-o todas as vezes, ao final de alguns meses, alguns estarão curados. Mas será que foi esse gesto que os curou?

Quando, em 1780, os médicos da Faculdade de Medicina de Paris questionaram Mesmer quanto à eficácia de sua cura, desejando escolher alguns doentes para ele curar sob as vistas deles, Mesmer afirmou que isso nada provaria! O acúmulo de casos pode servir de exemplo, mas não provar a eficácia do tratamento, a não ser que se empregasse métodos comparativos, como um ensaio clínico:

“Nada parecia atingir mais diretamente este objetivo do que um ensaio comparativo do novo método de cura com os métodos antigos. A administração de remédios não poderia estar em melhores mãos do que aquelas da Faculdade, e é evidente que se o método novo obtivesse vantagem sobre o antigo, as provas a seu favor seriam as mais positivas”.

Diante dos questionamentos e dúvidas dos médicos da Faculdade, Mesmer fez a seguinte proposta, reproduzida em seu livro Resumo Histórico dos fatos relativos ao Magnetismo Animal, que está incluído na íntegra na obra Mesmer – a ciência negada do Magnetismo Animal:

 

1. Fazer a escolha de 24 doentes, dos quais 12 estariam reservados pela Faculdade para serem tratados pelos      métodos comuns. Os outros 12 seriam enviados ao autor, que os trataria segundo seu método particular.

  1. Seria previamente realizado um protocolo do estado de cada doente. Cada protocolo seria assinado tanto pelos comissários da Faculdade como pelo autor e pelas pessoas propostas pelo governo.

  2. A escolha dos doentes seria feita pela Faculdade, ou pela Faculdade e o autor em conjunto.

  3. Para evitar todas as discussões posteriores e todas as exceções que poderiam acontecer segundo as diferenças de idade, de temperamentos, de doenças, de seus sintomas etc., a divisão dos doentes se faria por meio de um sorteio.

  4. A forma de cada exame comparativo das doenças e suas épocas seria fixada por antecipação, a fim de que na sequência não se pudesse travar qualquer discussão razoável sobre os progressos obtidos por um ou por outro dos métodos.

  5. O método do autor exigiria pouco gasto, não demandaria nenhuma recompensa de suas necessidades, mas seria natural que o governo bancasse as despesas relativas à manutenção dos 24 doentes.

  6. As pessoas propostas pelo governo assistiriam a cada exame comparativo dos doentes e assinariam os protocolos, mas como é essencial evitar da parte do público toda censura quanto à inteligência ou conivência, seria indispensável que os prepostos do governo não fossem ligados a alguma corporação médica”.

É interessante saber que Mesmer tinha a lucidez quanto a necessidade de se empregar testes controlados por uma metodologia científica para apontar a eficácia do tratamento. Isso em 1782! Todavia, com o progresso das ciências, o estudo duplo-cego, também conhecido como ensaio clínico em dupla ocultação, ficou evidente como o critério mais adequado de validação para as práticas experimentais da medicina, aplicada aos seres humanos.

Formam-se dois grupos. Num grupo, aplica-se um método inócuo e no outro o tratamento em questão. Por exemplo, para um grupo ministra-se uma pílula com o medicamento estudado e no outro uma pílula com farinha. Após o período determinado pelo protocolo da pesquisa, os casos são tabulados e verifica-se estatisticamente se há influência do remédio na cura a partir da porcentagem de sucesso. Desse modo, nem o examinador, nem o examinado sabem o que está sendo utilizado para seu tratamento. Todavia, em se tratando de métodos que não a ingestão de substâncias, o pesquisador precisa elaborar protocolos de pesquisa compatíveis com o teste que deseja realizar.

Ou seja, formar filas de curados para confirmar a existência do milagre e de que o sacerdote é um enviado de Deus não tem qualquer fundamento lógico, além de uma falsa propaganda dirigida a fascinar o público, cego em busca de uma solução para suas dores.

 

Mas também os curadores, e as casas espíritas oferecendo tratamentos de cura, mesmo nada cobrando e recomendando o não afastamento do tratamento médico, estarão ingenuamente iludindo e se iludindo caso não empreguem o registro dos casos, nem convidem pesquisadores treinados para aplicar testes clínicos, no sentido de apontar a eficácia do tratamento empregado. Pois se Mesmer, Hahnemann e Allan Kardec iniciaram suas ciências confiando na metodologia científica para justificar suas ideias, não haverá outro caminho senão fazer uso do progresso desses recursos para dar continuidade aos seus esforços em nosso tempo.

A dominação faz da ignorância o alimento de seu poder. E a educação é o verdadeiro caminho da liberdade, da solidariedade e do mundo feliz e saudável do futuro. Respeitar a ciência e suas progressivas descobertas é uma exigência incontornável para o Magnetismo Animal, a Homeopatia e o Espiritismo, ciências irmãs.

Por Paulo Henrique de Figueiredo, autor de Mesmer –a Ciência negada do Magnetismo Animal, e de Revolução Espírita – a teoria esquecida de Allan Kardec.

Publicado originalmente revolucaoespirita.com.br

Este conteúdo não reflete, necessariamente, a opinião da Casa Espírita Nova Era.


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