Quem escreveu o livro?
Por Marcelo Henrique Pereira (*)
Estamos em mais um 18 de abril… A comunidade espírita reverencia o “pontapé inicial” de uma Doutrina que já chega aos seus 157 anos de existência, perpassando várias fases e “lutando” para alcançar estágio mais avançado de compreensão interna (entre seus adeptos e simpatizantes) e propícia a, enfim, dialogar com a Sociedade.
Já fazem mais de 32 anos que me considero espírita. Foi em 1981 que tive minha “iniciação”, em grupos de estudo e reuniões doutrinárias, enriquecendo tais experiências com a variada leitura de livros e periódicos. Por todo esse tempo tenho constatado que os espíritas em sua imensa maioria dizem que a Doutrina Espírita É DOS ESPÍRITOS, mesmo quando tal afirmação se destina à produção literária assinada por Rivail, utilizando o codinome Allan Kardec.
E isto não é verdade!
A AUTORIA dos livros e dos volumes da Revista Espírita é do professor francês. Não somente porque ele “assina” cada uma das obras que editou e distribuiu originariamente em solo europeu, como pelo componente marcante de toda a produção literária: sua MARCA, sua IDENTIDADE, presente não só nos comentário (muitos, aliás, após cada um dos itens da obra primeva, “O Livro dos Espíritos”), como em outros volumes da chamada CODIFICAÇÃO ESPÍRITA.
Você já parou para analisar cada uma delas? Que visão você tem da obra como um todo? Em que partes está flagrante a produção intelectual dos desencarnados, por meio de variados médiuns? Em que momentos se enxerga o homem Rivail?
Atente para o fato de que APENAS cerca de 30% dos escritos contidos nas obras de Kardec têm “assinatura”. Poderíamos citar Fénelon, Erasto, Verdade, João Evangelista e tantos outros. Excetuando-se a forma estrutural do livro inicial, com perguntas e respostas – em que, pelas explicações de Kardec, as perguntas foram formuladas seja previamente seja postumamente à obtenção das páginas psicografadas, porque o Codificador acabava recebendo muito material que ia além das questões originalmente previstas e, também, a partir de respostas às perguntas antes formuladas, no período precedente ao do seu comparecimento às “sessões espíritas” em que se fez presente, quando do desenrolar dessas, a partir das respostas dadas, compunha, na hora, instantaneamente, novas questões para aprofundar o conhecimento sobre determinados temas ou para clarificar alguns pontos que, no seu entendimento, ainda restavam nebulosos.
Sim, a AUTORIA INTELECTUAL de TODAS as questões é de Msr. Rivail, o que lhe dá um dos elementos de sabedoria e perspicácia que, por analogia, conferem magistralidade ao seu trabalho. Como tenho formação lítero-jornalística, aprendi nos bancos escolares, com os mestres da comunicação social, de que uma ótima entrevista não é medida pela excelência de quem é ou será entrevistado, mas pela tenacidade e inteligência do entrevistador, que pode extrair do outro as melhores respostas.
Como se isso não bastasse, temos verdadeiros compêndios técnicos, aparentemente “sem assinatura”, em trechos das obras codificadas por Rivail que são exatamente dele, produzidas, é bem verdade, com o auxílio de sua interpretação e capitulação, na memória, dos infinitos textos de produções mediúnicas, via psicografia, que lhe chegaram às mãos. Inclusive aqueles que foram, por seu método (o Controle Universal dos Ensinos dos Espíritos – CUEE), descartados por conterem elementos contrários à principiologia adotada pelo mestre lionês e referência básica do seu trabalho.
Kardec foi um gênio, muito além do seu tempo. Missionário, dentro do conceito que se dá a esse termo pela exegese espiritista, aliou sua bagagem cultural atemporal com as experiências didáticas e profissionais de sua (então) última existência física (conhecida) e pôde trabalhar a “quatro mãos” quando associado a cada uma das inteligências desencarnadas que lhe forneceu material “escrito” (psicografado) ou com quem conversou nas sessões espíritas primitivas – especialmente com o espíritos Erasto e Verdade, os que mais proximamente lhe assistiram, o primeiro como mentor pessoal e o segundo como “coordenador espiritual” da tarefa grandiosa que abraçou.
Este 18 de abril, mais do que uma celebração aos (e dos) Espíritos da Codificação, aqueles “escolhidos por Jesus” e “associados à tarefa do Bem”, que permanecem conosco nas atividades espíritas dos dias de hoje – apesar de, lamentavelmente, os espíritas terem em numeroso quantitativo ABANDONADO a atividade dialógica com os Superiores, preferindo APENAS as conversações orientativas aos desencarnados necessitados, que acodem às casas e às sessões de mediunidade, desprezando IMPORTANTÍSSIMA FERRAMENTA que, no próprio dizer de Rivail, seria a GARANTIA da PERMANÊNCIA dos ensinos espirituais, quando caminhando paripasso com a Ciência dos homens.
Mas, ainda há tempo… Quem sabe os “homens de boa vontade”, espíritas convictos e estudiosos, resolvam retomar e aperfeiçoar a metodologia kardeciana para COMPLEMENTAR, AMPLIAR e REVER a própria obra de Kardec.
Isto, é claro, se os DOGMÁTICOS ESPÍRITAS, os que mitificam a obra original, não se puserem – como tem-se posto – à frente, com seus escudos e espadas para dizer que “somente com autorização superior”, utilizando-se de “espíritas e espíritos escolhidos ou oficiais” poder-se-á dar “continuidade” ao trabalho de Allan Kardec.
Enquanto isso, seguimos nós… Trabalhando sempre!
Feliz dia do livro espírita! Ode ao 18 de Abril! Muito obrigado, Rivail!
(*) Marcelo Henrique Pereira, Doutorando em Direito, Secretário Executivo da ABRADE, presidente do Centro Cultural Espírita Herculano Pires, São José (SC).