O Espiritismo e a sua tatuagem
Marcelo Henrique
“Quero ficar no teu corpo
Feito tatuagem
Que é pra ter dar coragem
Pra seguir viagem”, Chico Buarque
Hoje é 18 de abril, um dia ímpar para o segmento dos espíritas em todo o mundo. Homenagens diversas, que vão de moções, comendas, decretos de nomeação de logradouros públicos, palestras comemorativas, artigos, frases… O fato é que este dia, que já é chamado o “dia dos espíritas”, mas deveria, ser, mesmo o “dia do Espiritismo”, dada a diferença que há entre os primeiros e o segundo, em face das interpretações pessoais, dos “achismos” e das introduções de conceitos e teorias estranhas nas “práticas espíritas”. O Espiritismo é, apesar do que se faz dele, a Doutrina trazida pela mão segura, racional, lógica, sistemática e amorosa do Professor francês.
Denis, a propósito, um dos seus continuadores, asseverou de modo profético e, até, com suspeita do que poderia vir a ocorrer – e ocorreu – que o Espiritismo seria aquilo que os homens (espíritos encarnados) dele fizessem. E o que os espíritas, sobretudo no Brasil, têm feito com o Espiritismo, se afasta por completo da teoria e da prática que Kardec empreendeu, de 1857 a 1869, na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas. A Escola de Espíritos tornou-se muitas coisas em terras tupiniquins, de hospital a templo, de consultório a igreja, de confessionário a santuário. Tudo muito distante das orientações de Kardec ao movimento espírita, de seu tempo e dos seguintes.
Herculano, de outro modo, em vários momentos de sua defesa incondicional da fidelidade a Kardec demonstra que muitos querem “adaptar” o Espiritismo aos seus próprios exercícios de pensamento, ou “adequar” a Doutrina às suas
práticas, quando deveriam, do contrário, adaptar ou adequar suas condutas aos ensinamentos espiritistas. A diferença é abissal entre uma e outra coisas.
Mesmo que os adeptos e simpatizantes da Doutrina dos Espíritos em solo brasileiro se afastem do Mestre, por suas condutas, posturas, práticas e teorias, a marca indelével de Kardec está em todo o Espiritismo. A partir do momento em que os fenômenos de efeitos físicos chamaram-lhe a atenção, por volta de 1855, passando pelo registro das comunicações mediúnicas que lhe foram encaminhados por mais de 1.000 localidades diferentes e pelo diálogo maiêutico que ele estabeleceu com as Inteligências Imateriais por meio dos médiuns, aquele pedagogo europeu, sisudo e compenetrado, amoroso e dedicado, organizou, sistematizou, definiu parâmetros, compôs obras selecionadas por temáticas distintas e deixou-nos trinta e uma obras, por ele publicadas, mais uma gravura e, ainda, permitiu fossem descobertos por seus continuadores, um grande e relevante conjunto de manuscritos inéditos, postumamente publicados.
Pode-se dizer com propriedade que o Espiritismo tem uma tatuagem: o nome Allan Kardec impresso em sua “pele”, com tintas que são inapagáveis, as quais não podem ser removidas – como as corporais, na pele humana, por procedimentos cirúrgicos – permanecendo de modo indissociável e pleno. Não há Espiritismo SEM Kardec, apesar de sabermos que a Espiritualidade, a Mediunidade, a Comunicabilidade e os Efeitos das Relações entre os Espíritos (Encarnados, isto é, vivos e Desencarnados, os mortos) não seja patrimônio exclusivo da Filosofia Espírita, estando presente em todos os quadrantes dos mundos habitados, conforme a cátedra contida em “O livro dos espíritos”, obra que foi lançada exatamente neste dia, e em várias outras dissertações das demais obras kardecianas.
Essa tatuagem é a nossa marca, a nossa identidade, a nossa referência.
Mesmo que o Codificador tivesse como característica a humildade e houvesse informado, sucessivas vezes, em seus textos, que a obra era DOS ESPÍRITOS, sua inteligência e perspicácia foram decisivas para a construção do pensamento espírita sobre o planeta. E, como dizem os belos versos de Buarque, essa tatuagem nos dá a coragem necessária para defender a autenticidade da obra de Rivail, ante tanta literatura espiritual e espiritualista, desde o início do século XX até os nossos dias, por distintos médiuns. E, para seguir viagem, essa coragem é necessária! Vamos?